O DESENVOLVIMENTO DO KARATÊ

O DESENVOLVIMENTO DO KARATÊ-DO NO JAPÃO

O KEMPO (ou CH ÚAN-FA) foi introduzido no Japão com nome de KARATÊ (a arte chinesa de luta) ou KEMPO (caminho do punho), por volta de 1627 ou 1644 por um chinês de origem nobre, de nome CHEN YUAN PING (ou GEN PIN CHIN), o qual, juntamente com o KARATÊ introduziu também o SAI , o qual foi posteriormente adotado pelas forças policiais, com pequenas modificações, transformando-se no JITTE-SAI.
GEN PIN CHIN era também poeta e artista, especializado em cerâmicas e responsável pela produção das famosas louças GEN PIN.
O início da Era MEIJI (1868) marcou o fim do período feudal (EDO) no Japão, e com isto os samurais foram forçados a abandonar suas armas, cortar o rabicho ou trança que usava na parte superior da cabeça (CHON MAGE) como símbolo de seu “status”. O Japão abria –se para os estrangeiros, os quimonos começaram a ser substituídos por roupas em estilo ocidental, e a popularidade do JUJITSU e do KENDO entrava em franco declínio.
Mestre JIGORO KANO desenvolvia uma nova arte marcial, o JUDO, que rapidamente começou a suplantar o JUJITSU principalmente após uma vitória decisiva em uma competição ocorrida em 1886 no Departamento de Policia de Tokyo.
Neste mesmo ano, Mestre ANKO ASATO, um dos expoentes na prática do Karaté em OKINAWA, fez m “tour” pelo Japão, vencendo a todos adversários praticantes de outras artes marciais, inclusive a SAKUJIRO YOKOYAMA, o melhor e mais forte JUDOKA naquela época.
Em 1902, MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO DO JAPÃO autoriza a PREFEITURA DE OKINAWA (as ilhas do arquipélago RYU KYU tornaram-se províncias japonesas desde 1879) a incluir o Karatê como parte do programa educacional a ser ministrado em suas escolas públicas.
Logo após a guerra Russo-Japonesa, em 1906, um grupo de Karatekas liderados por GICHIN FUNAKOSHI efetuou a primeira demonstração públicas de Karatê, de que se tem registro, em OKINAWA, na inauguração do novo prédio da PREFEITURA.
Posteriormente, este mesmo grande mestre de Karatê, GICHIN FUNAKOSHI, (o qual nasceu em SHURI, em OKINAWA, No ano de 1869, tendo iniciado seus treinamentos de Karatê com 11 anos e sido aluno dos mestres ITOSU e AZATO), foi convidado pela Prefeitura de OKINAWA a realizar em 1916 a primeira demonstração pública de Karatê fora de OKINAWA, realizada no Centro de Artes Marciais da cidade de KYOTO, no JAPÃO.

Em março de 1921, FUNAKOSHI é novamente encarregado pela Prefeitura de OKINAWA de organizar uma nova demonstração pública de Karatê, desta vez para o futuro imperador do Japão (na época o Principe Herdeiro) em caminho para uma viagem à Europa.
Em função do sucesso desta demonstração é convidado para participar em 1922 da PRIMEIRA DEMONSTRAÇÃO ATLÉTICA em TOKIO, sob os auspícios do MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Neste mesmo ano, publica o primeiro livro de Karatê de que se tem noticia; sob o título “RYU KYU KEMPO: KARATÊ”, o qual foi republicado no ano seguinte, em edição revista e ampliada, sob o título “RENTAN GOSHIN KARATÊ - JITSU”.
A acolhida recebida em TOKIO, e o sucesso das apresentações efetuadas levou FUNAKOSHI a retornar em 1923, fixando residência na capital japonesa.
Neste mesmo ano outro grande mestre de OKINAWA, OKINAWA, CHOKI MOTOBU, dirige-se para OSAKA onde passa a ensinar Karatê, sendo seguido posteriormente, em 1929 por CHOJUNMIYAGI (fundador do estilo GOJU-RYU) e por KENWA MABUNI (fundador do estilo SHITO-RYU).

Como curiosidades registramos que primeiro curso de Karatê universitário foi formado pela UNIVERSIDADE DE KEIO em 1924, e que a UNIVERSIDADE DE TOKIO foi a primeira a exigir o uso de equipamentos protetores nas competições, em 1930.
Nos primeiros anos de sua estada em TOKIO, FUNAKOSHI alugava “dojos” de judô e kendô para dar aulas de karatê, que também eram realizadas em várias universidades e até mesmo na KODAKAN, a meca do JUDÔ (alias deve-se salientar bastante o grande apoio e incentivo dado por JIGORO KANO ao desenvolvimento do Karatê no JAPÃO). Com o crescente aumento da popularidade do Karatê, em 1936 é fundada a SHOTOKAN (significando CASA DE SHOTO, sendo SHOTO o pseudônimo de FUNAKOSHI em suas obras literárias) o que, além de vir a torna-se um dos marcos mais importantes da história do karatê no Japão, transformar-se-ia também no nome do estilo de karatê praticado. Nesta época, FUNAKOSHI abandona a denominação TANG-TE e modifica a interpretação dos caracteres componentes da palavra KARATE pela sua correspondência japonesa a MÃOS VAZIAS , alteração esta levada pelo profundo sentimento anti-chinês reinante no Japão, e que veio a ser aceita por todos em pouco tempo até mesmo pelos tradicionais mestres de OKINAWA.

Para reforçar esta nova interpretação dos caracteres componentes da palavra KARATE, FUNAKOSHI utilizava-se da seguinte figura de retórica: “Da mesma forma em que a superfície polida de um espelho reflete tudo que é colocado em sua frente, e como um vale calmo e tranquilo propaga sons quase inaudíveis, deve o praticante de karatê manter sua mente vazia de esgoísmo e maldades, de forma apta a perceber e reagir adequadamente as situações com as quais venha a se defrontar. Este é o significado de KARA ou VAZIO em KARATÊ”.
Nesta época começam a surgir os diferentes estilos de Karatê japonês, tais como o WADO-RYU, criado por HINORI OTSUKA com a incorporação de algumas técnicas de JUJIUTSU, e uma variação do GOJU-RYU , desenvolvida por YAMAGUCHI GOGEN, um discípulo japonês do Mestre CHOJUN MIYAGI.
Ainda em 1936, FUNAKOSHI publica o seu livro mais famoso: “KARATÊ-DO KYOHAN (THE MASTE TEXT)”, continuando a desenvolver um intenso trabalho em prol da consolidação do Karatê no Japão, culminando com a criação, em 1948 da JAPAN KARATÊ ASSOCIATION (JKA) da qual foi o primeiro Instrutor Chefe.
GICHIN FANAKOSHI morreu em abril de 1957, com a idade de 88 anos, deixando como legado um memorável trabalho desenvolvido em prol do engrandecimento do Karatê-Dô, razão pela qual é reconhecido por muitos como o principal responsável pelo desenvolvimento do Karatê-Do moderno.

Dentre seus alunos destacaram-se: MASATOSHI NAKAYAMA (que o sucedeu como Instrutor Chefe na JKA, tendo falecido recentemente, SHIGERU EGAMI (Presidente e Instrutor Chefe do KYOKUSHINKAI), HIROKAZU KANAZAWA (fundador e Instrutor Chefe da SHOTAKAN KARATÊ INTERNATIONAL – SKI), HIDETAKA NISHIYAMA, TAIJI KASE, KEINOSUKE ENOEDA E TURUYUKI OKAZAKI (atual Instrutor Chefe da JKA para as Américas).
BODHIDHARMA: UM ENIGMA
A história do KARATÊ-DO é constituída basicamente com lendas, mais do que com fatos devidamente comprovados e registrados.
Alguns historiadores acreditam que as origens do KARATÊ-DO estão baseados na Índia, enquanto que outros as ligam à China e a BODHIDHA (o qual seria originario da Índia).
O conhecimento efetivo sobre BODHIDHARMA é bastante limitado. De acordo com o historiador P. HAINES, em seu livro KARATE´S HISTORY AND TRADITIONS (TOKIO: TUTTLE COMPANY 1954), as fontes disponíveis mais fundamentadas com indicações sobre a existência de BODHIDHARMA são livros: BIOGRAPHIES OF THE HIGH PRIESTS, do Monge TAO-HSUAN (em 654 D.C), THE RECORDS OF THE TRANSMISSION OF THE LAMP, do Monge TAO-YUAN (em 1004 D.C.). Além disso, alguns eminentes historiadores budistas, tais como D.T. SUZUKI, asseguram que BODHIDHARMA efetivamente existiu, não obstante a quantidade de mitos e lendas que foram incorporados á sua biografia; em virtude das evidências existentes de que no ano 520 D. C (ou 526/527 D. C), um monge nascido da Índia, na cidade de KANCKIPURAN perto de MADRAS, viajou para a cidade chinesa de KUANG, onde foi recebido por WU TI, um dos imperadores da dinastia LIANG; tendo posteriormente viajado para um mosteiro nos domínios do rei WEI, onde ficava longas horas em meditação profunda.
Aqueles que realmente acreditavam na existência de BODHIDHARMA asseguram que ele era o 3º filho do rei SUGANDHA, do sul da ÍNDIA, pertencia a uma casta de guerreiros conhecida como KSHATRIYA, tendo passado sua infância e juventude em KANCHIPURAM, uma pequena província budista ao sul da cidade de MADRAS; onde recebeu seu treinamento em meditação budista através de seu mestre, PRAJNATARA, que também foi o responsável pela mudança do nome do seu jovem discípulo de BODHITARA para BODHIDHARMA; o qual revelou-se em pouco tempo ser um aluno excelente e um lutador (praticante de artes marciais) fora de série; alcançando ainda jovem os títulos de Mestre em budismo e Chefe guerreiro da KSHATRIYA.

Logo após a morte de seu mestre PRAJNATARA, BODHIDHARMA viajou para a CHINA, sendo admitidas duas razões básicas para tal: a primeira, de que este teria sido o último desejo do seu mestre, e a Segunda, de que ele mesmo estaria muito preocupado com a decadência e declínio do budismo fora da ÍNDIA.
As informações sobre as atividades de BODHIDHARMA na CHINA são muitos variados e alguns casos discrepantes.
TAO-HSUAN, em seu livro BIOGRAPHIES OF THE HIGH PRIESTS, esclarece que a data geralmente aceita como correta para a chegada de BODHIDHARMA na CHINA é no ano 520 D.C., ficando hospedado durante algum tempo no templo de YUNG-NING, na cidade de LO-YANG (atual HONAN), onde inclusive chegou a ordenar um noviço, seu seguidor, de nome SENG – FU. Registros históricos sobre este templo indicam que o mesmo foi construído em 516 D. C., e destruído por incêndio em 535 D. C., sendo que a partir de 528 D. C. ficou ocupado por tropas guerreiras invasoras; o que reforça a teoria da possível presença de BODHIDHARMA dentro do período 516 e 528 D. C..
Uma variação desta teoria é encontrada no livro THE RECORDS OF TRANSMISSION OF THE LAMP, situa BODHIDHARMA em Cantão por volta de 527 D. C., sendo que após algum tempo nesta cidade, deslocou – se para o norte da China, indo encontrar – se com o imperador WU, da dinastia LIANG (502-557 D. C.) em CHING – LING (atual NANKIM).
Conta a historia de que quando o imperador WU encontrou – se com BODHIDHARMA, perguntou – lhe: “Mandei trazer as escrituras budistas de sua terra para a minha – Construí belos e majestosos templos onde meus súditos passaram a aprender os ensinamentos budistas. Quais as recompensas que receberei por isto na vida após a morte?”. Ao que BODHIDHARMA respondeu – lhe: “Nenhuma”; referindo – se ao principio budista de que não se deve recompensar às ações feitas com o objetivo de se obter recompensas.

Com esta resposta, o imperador ficou furioso e expulsou o monge do palácio, tendo então BODHIDHARMA seguido seu caminho para o norte da CHINA, dirigindo – se à província de HONAN onde situava – se o templo SHAOLIN nas montanhas SUNG.
Após chegar ao templo, BODHIDHARMA meditou em frente a um muro durante nove anos a após ter completado o seu período de meditação iniciou sua pregação sobre ZEN BUDISMO. Percebeu então que os monges não estavam com condicionamento físico adequado para suportar os rigores dos métodos de ensinamento ZEN, razão pela qual desenvolveu uma série de exercícios, baseado em sua experiência como guerreiro, destinados a fortalecer fisicamente aos monges. Este conjunto de 18 exercícios, conhecidos como I – CHIN - CHING (as dezoito mãos de LO - HAN), é que se supõe ter sido a primeira forma do SHAOLIN KUNG – FU ou SHORIN – JI KEMPO, e que veio a dar origem ao KARATE – DO.
Confirmada a existência de BODHIDHARMA e sua presença no templo de SHORIN – JI, torna – se ele uma figura duplamente importante para a historia das artes marciais, não apenas por ter desenvolvido o SHORIN – JI KEMPO, como também por ter sido o primeiro patriarca do ZEN BUDISMO, e como tal, patrono da maioria dos praticantes de artes marciais japonesas, que o denominavam DHARUMA e colocavam seu retrato em local de destaque em seus “DOJOS” ou salas de treinamento.
Segundo o mestre chinês HUNG I – HSIANG, o grande mérito dos ensinamentos de BODHIDHARMA foi a introdução na China dos conceitos de WU – TE, ou de virtude na pratica de artes marciais, com isto englobando as qualidades de disciplina, autocontrole, humildade e respeito pela vida humana.

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